Porque trabalhar com Educação Permanente em Saúde?
Um desafio muito presente é o
de considerar a habilitação profissional orientada para as necessidades
de saúde da população, ou seja, tornar a rede de serviços e suas equipes
competentes para realizar a atenção às necessidades sociais por saúde.
Dessa forma, acredito que a EPS criará condições para o debate, para a
problematização, ajudando a identificar as necessidades de formação de
acordo com as situações apresentadas pela equipe, ajudando a identificar
as potencialidades do grupo, estabelecendo parcerias e reconhecendo as
prioridades a serem trabalhadas.
Acredito que o facilitador deve mobilizar o
grupo para a mudança, mas não determinando o que devemos ou não mudar e
sim, discutindo dentro do grupo o que o grupo precisa, ou melhor, sente
necessidade de mudar. Além disso, é importante considerar e valorizar o
que cada trabalhador já construiu em sua trajetória profissional.
Schwartz (2003) nos alerta para o fato de não conceber, por exemplo,
“formação de adultos”, “formação profissional” sem se interrogar sobre o
que os “formandos” já construíram com o saber em seu trabalho, e como
esse trabalho sobre suas próprias competências inscreve-se em projetos
de vidas. Negara as experiências, para o autor, é contentar-se com a
esterilidade do ato educativo. É simplesmente passar
informações, nem sempre adequadas para aquela realidade, com pouca ou
nenhuma garantia de que haja uma sensibilização para um “fazer”
diferente do instituído. Antes de mais nada, a
facilitadora deve ouvir o grupo e estimular a percepção dos nós e
despertar inquietação para encontrarmos o caminho certo. Nessa
trajetória inicial, evidenciei no meu cenário de trabalho que nos falta
o hábito de escrever as coisas positivas, colocarmos o nosso sucesso no
desatar de cada nó que enfrentamos. Relatamos e discutimos problemas,
mas não falamos sobre o usuário que ajudamos a encaminhar, sobre o
retorno que tivemos de algum serviço, sobre o obrigado que recebemos e,
principalmente, como nos sentimos realizados na construção do SUS. Essa
foi uma das mais importantes mudanças disparadas no grupo, pactuamos que
passaremos a registrar não só as dificuldades, mudando o foco do olhar
para as energias positivas, pois é isso que nos sustenta em um contexto
de tanto sofrimento como a emergência. Mesmo nos casos em que, não
possamos desatar os nós, podemos “tentar fazer” e isso já é uma grande
satisfação.
Acho que o maior desafio para avançarmos em
estratégias de implementação de práticas de EPS é trabalhar em equipe.
Temos, principalmente dentro das unidades hospitalares, uma forte
divisão dos profissionais em “nichos” de saber e de poder. Por
exemplo, ouvi de uma colega do curso de EPS que não deveria ser assim a
dinâmica, misturando profissionais de formação superior e nível médio,
“nós não podemos nos misturar”, mas podemos trabalhar juntos e termos
objetivos comuns. De que forma seremos equipe se não podemos construir
aprendizagens coletivamente? De que forma podemos, tomados pela
“pedagogia da implicação”, reconhecer o outro e o seu lugar como sujeito
implicado, sem constituirmos uma equipe? Acho que os trabalhadores
possuem experiências e vivências muito ricas e devemos “aprender a
aprender” em equipe, compartilhando saberes, trocas, comunicações e
situações simples do cotidiano.
Observando o nosso cenário e como acontecem
os processos de mudança dentro do meu local de trabalho, percebo que a
maioria delas ainda são verticalizadas, decisões de gestores que muitas
vezes nem conhecem a realidade local. Essas mudanças já nascem
condenadas ao fracasso, pois não provocam envolvimento e comprometimento
dos trabalhadores. Estes trabalhadores sentem-se pouco valorizados pelo
fato de não serem ouvidos e serem deixados de lado na hora de decidir e
mudar. Quem conhece a realidade e sabe o que o possível ou não de fazer
naquele momento não é ouvido, simplesmente é comunicado da mudança e
cumpra-se. Dessa forma, inúmeras sugestões e formas diferentes de fazer
são desperdiçadas, deixadas de lado por uma disputa de vaidades, um
modelo de gestão não democrático, onde alguns pensam e outros executam.
Acredito que a mudança desse processo,
depende mais de nós trabalhadores do que propriamente dos gestores,
precisamos nos infiltrar, seja nos colegiados de gestão, conselho
gestor, enfim, fóruns que dão voz ao trabalhador. Mas essa participação
na gestão deve ser real e não somente para cumprir uma exigência
política. Muitas vezes, escuto dos trabalhadores, que tal mudança já foi
apontada por eles, mas não se efetivou, o gestor ouviu, disse que era
boa a sugestão e necessária a mudança e, no entanto, não saiu do papel.
Entra aí, novamente, o papel dos colegiados e seu fortalecimento através
da ampla participação.
Quais as maiores aprendizagens até agora? O
maior aprendizado que obtive com a EPS foi a inquietação permanente com
os processos de trabalho. Sempre escuto dos colegas, quando alguma coisa
vai mal dentro do serviço, que devemos realizar treinamentos e
capacitações e então tudo estará resolvido. Ingenuidade ou
desconhecimento, não sei o que pode melhor explicar essa atitude; diante
de um processo de trabalho que precisa ser repensado devemos convocar a
equipe para a mudança, buscar envolvimento e possibilidades.
Os treinamentos trazem muitas coisas
positivas, mas não resolvem problemas no andamento do trabalho, é
preciso mais, é preciso despertar dentro do grupo a vontade de mudar,
sendo que aí a EPS é crucial, pois transforma o comprometimento
individual no coletivo, abre espaços para o grupo se manifestar e juntos
construir um cotidiano de trabalho melhor.
Dentro da emergência propus trabalhar a
construção da rede do SUS como espaço de educação profissional,
utilizando a EPS para isso, através da realização de visitas programadas
com as equipes do acolhimento nas unidades de saúde. O objetivo dessas
visitas é mapear os tipos de serviços que as unidades oferecem para a
população, como ocorrem as trocas entre as equipes e os encaminhamentos
realizados, como são direcionados os casos não atendidos nas unidades e
se ocorre articulação com a rede de serviços de saúde (referência e
contra-referência). Nessas visitas, além da troca de informações,
ocorrem trocas de experiências, o trabalhador tem oportunidade de
apresentar o seu trabalho, incentivando e valorizando a participação dos
trabalhadores nas atividades do serviço. Da mesma forma, propicia um
conhecimento de outras realidades e contextos, facilitando os processos
de encaminhamentos e orientações dos usuários.
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